21 julho 2009

Desprendimento


só aprendi a amar
nunca tentei defender
(nem tenho espírito bélico);
- é mais difícil dizer sob o luar?
caminhei na direção de me mostrar
jamais pensei em julgamentos
olhares que não fossem meus
segui em contradição com o Sol
aprendi a amar sem provar,
experimentar, degustar, saborear...
fiz-me de entrada.
- não preferi os bilhetes insinuantes
às dores e sabores que ficavam na boca...
nunca me defendi do meu amor
mesmo quando estive sob o fundo-falso do poço
nunca lutei contra, seguia o rio...
bloqueava, driblava, seduzia
amortecia a queda e, aos poucos, morri de amor.
só aprendi a amar
amar o que o outro queria
amar o que você defendia
amar tudo o que nada dizia.

- já não sei mais amar.

19 julho 2009

Amar

"Amar é dar o que não se tem." Platão (depois Lacan)
No auge dos meus trinta anos ou no amanhecer do resto dos meus dias, ainda não consigo definir melhor o amor. Acredito que sendo tão pessoal e universal, o amor (criação nossa) não tenha outras definições plausíveis. O ato em si tem infindáveis bordões (amar é isso, aquilo, meio-amargo, "meia-calabresa"), mas o amor, não. "Sabe lá, o que é não ter e ter que ter pra dar, sabe lá" (Djavan). Não pretendo o posto de Platão ou Lacan, só quero entender isso que não dou nome, nem forma, nem textura e tanto dói ... algumas vezes é vazio noutras transmuta-se num infinito, desprezo gratuito e doação sem limites, não tem uma sensação mas uma verdadeira alucinação em todo o corpo, desregramento dos sentidos, algumas vezes faz sorrir mas, de ordinário, chora-se. "Quem inventou o amor me explica por favor" (Renato Manfredini). E lá se vão mais poetas...

Percebi a noite

percebi, outra vez, que era noite
noite sem sombras nem desejo
gritos ou sussurros já haviam calado
percebi a noite como um exaustivo espelho

percebi que era noite clara
semáforos angustiados nublavam o néon
televisores formam um insone vitral
percebi tudo na solidão de minha existência

a noite já era um não-ser
caras plásticas sem vestígio de qualquer alma
nomes de promessas e instantes de ofensas
percebi a noite como uma máscara vienense

a noite fria dos medos
ruas em transe e falas contidas
sonha-se um sonho cinza em cada meio-fio
a noite já não era minha madrugada
- já não tenho mais café!
ouço passos apressados e encantamentos modernos
semblantes diferentes que clamavam e reclamavam o mesmo

percebi que amanhecia
e voltei a sorrir.

18 julho 2009

Ferramentas

arco-íris e por-do-sol

nos tratamos de forma mais suave
sorrisos...
assim nos permitimos sonhar.

voltei a bater à sua porta
não lhe trouxe flores dessa vez
mas minha alma decorada com alfinetes de verdade
(estava linda e com um olhar ainda confuso)

repessamos nossos lugares à mesa
toda mancha, sombra e silhueta
não quero mais outra "aquela" música
nem esperar cada piscar de amanhecer

venha me beijar
cale minha boca com seu desejo
quero sentir as pétalas pelo meu corpo
perfumando-me de saudade-rosa e quero-mais

hora de encontros
no crepúsculo de nosso passado
alvorecer de um devir em amor
em cada espectro de viver, sentir, sorrir, sumir


ferramentas...
gotas de chuva em nossa janela.

13 julho 2009

números

temos um número, um basta!


um padrão e uma meta

um na porta da sala

outro na ponta da testa

temos um número no corpo

nas almas...

que Cristo deixa ou leva

nas mercadorias de grifes famosas

nos pratos das balanças assimétricas.

temos um outro no espelho

de costas

ou de frente

não são os mesmos.

mudam nos olhos, nos medos

ainda temos os números que tentam competir com o desejo.

nos poemas eles se repetem, repetem

repetem.

no quadro da vida

escrita, lida, rezada, murmurada

na palavra (não-bem-quase) dita

realizamos um número que não é.

12 julho 2009

eu

eu
eu te amo
eu me amo
eu o amo
eu a amo
eu não
eu, sim, amo
eu quem amo?
eu só amo!
Não diga que me ama
abrace meu peito
toque nas minhas mágoas
aceite este co(r)po meio-cheio
e diga que dormiremos juntos
Não prometa largar tudo
deixe-me ver sua alma
fazer um coral com nossos grilos
aceite a toalha na cama
assim, prometo nada lhe prometer
Não jure secretamente
cuide de suas asas e
esqueça dos fantasmas nos nossos quadros.
Representações.

30 junho 2009

Partindo II



não percebia porque fugia
apenas corria, demasiadamente corria
corria de mim, dos sonhos, do espelho
da calmaria e do susto no banheiro

fugia, calava - calado
até os olhos ficarem mudos
na guerra silenciosamente travada
nas entranhas do que me deixa em silêncio

rodopiava feito uma bailarina sem pernas na própria arena
onde mal podiam passar os sonhos ...
eu não sufocava, mas era inútil correr
eu não sabia nem por onde começar a fugir

rodar, radar, pensar, rodar
ficar, rodar, respirar... sei lá!
na mente de quem foge
só importa não parar para falar.

p.a.r.t.i.n.d.o.


já não sou poeta
quebrou-se algo na altura dos dedos
e, sem ver a brecha,
saí do céu sem tocar a terra.

tenho apenas uma caneta
deixei de sentir o rio...
fiquei tanto tempo sem olhar para mim
que me acostumei com o espelho vazio
talvez ser bardo seja ser o próprio espelho
- faça um verso para não esquecer
- faça um pedido que possa merecer
escrever o que atrair o olhar

falta de versos - espelho morto
falta de sono - pensamento absorto
como tornar familiar o papel em branco
sem pensar no primeiro olhar para o mundo das pessoas?

Mais do Mesmo Alívio!!!