24 dezembro 2020


Estava com saudade 

do mar, 

do Porto, 

do Sol, 

do cair da noite! 

Precisava arrancar de mim

Tudo que não quero

Tudo que cansei

Tudo que pesa. 

E que só o mar

O mar da Bahia

De Iemanjá 

e Mikaiá

É capaz de curar!



15 dezembro 2020

Ninguém foge à sua natureza 

Por mais escrutinada

Por mais talhada


Por mais domada  


A essência é um núcleo duro de certezas


O carnívoro não reconhece nas flores 


O mesmo valor que as borboletas


-Lhe faltam asas e 


uma forma de delicadeza, 


Para espalhar por aí pólen e cores  


Ninguém escapa à sua constituição


Aos alicerces erigidos 


Com estes ou aqueles signos


Até o ponto de basta 


Onde voltar não é mais opção. 


A nossa borboleta não aprecia a trêmula carne 


Como o faz um felino em sua sanidade 


-Lhe falta adrenalina 


E um tipo especial de destreza, 


Para transformar uma caçada em arte. 

28 abril 2020

Quarentena IV

Eu escrevo cantos
Para aplacar a falta
Pra não encharcar a fronha
Pra acordar cedo, disposto
E não ficar pelos cantos

Eu escrevo a presença
Para tornar real
Para não sofrer sozinho
Pra não ficar rouco
De reclamar pela ausência

Eu escrevo poemas
Pra sair do virtual
Para as palavras roçarem
Para que as perdas
Não sejam temas da quarentena

Eu apenas escrevo
Para alguém ler, talvez
Pra sobreviver, é certeiro
Pra continuar amando, eu
Escrevo nos dias que não conto.

Eu escrevo pra transbordar
Para não me deixar
Para não me ausentar
Para virar a mesa do tédio
E negociar viagens astrais. 

17 abril 2020

Quatentena 3⁰

Sei que não pode vir 
Te respeito e 
Aos sábios do mundo
Sei que não pode vir 
E que o tempo 
É de um esperar profundo
Vou desligar a TV
Não há o que insistir
Já não tenho livros pra ler
Vou inventar poemas 
Para que venha me visitar 
Sei que não pode vir
Mas a nossa banda - não o bastante - larga 
Pode a saudade aplacar  
Quando não posso
Tocar, só contemplar, teu amor. 
Sei que não pode vir
Sei do que você se ocupa
Sabe sempre como estou
Inventamos outra moda 
Delineamos outra forma de amar 
Quando está com a razão 
D'eu não fugir
D'eu não chorar. 
Sei, muito, que ainda não pode vir
Mas você é tão hábil quando me olha
Que por segundos 
A tela fria que nos separa 
Vira algo ainda do porvir 
Um delírio de amantes 
Um desejar fecundo
Sei que não pode vir
Que é tempo de espera 
Somos sóbrios 
Somos tantos, e não sós que 
Não fazemos Quimera 
Quando sei mesmo que não pode vir
Percebo que algo de ti 
Sempre ficou a lembrar 
Que você é Sol
Me iluminando ao mar. 

11 abril 2020

Quarentena 2⁰

Quando quero te ver
Nestes dias tão estranhos
Fecho os olhos, prendo a respiração
E te vejo tão grande e colorida
Num infinito e seus tamanhos

Quando penso em você
Nestes dias de tanto cortisol
Me deito e abraço o travesseiro
E te sinto tão perto
E a solidão é revisitada pelo desejo

Quando preciso de você
Nestes de tão pouco abraços
Mergulho embaixo do chuveiro
E sua presença são as gotas que descem
E me agarro à água sem embaraço

Quando tenho algo pra dizer
Que ultrapassa as novas tecnologias
E só existe num sussurro no ouvido
Me debruço na janela
E convenço os passarinhos em doce melodia.

Quando quero você
Sei que tenho a nós. 

Décio Plácido, 11.04.2020

31 março 2020

Quarentena

Foge! Mesmo um minutinho...
No instante do piscar de  todos os olhos 
Com a mesma velocidade da dúvida
Vem, com ou sem materialidade, compartilhar o nós. 

Vem! Nos insinuemos ao desespero
Que a saudade é feito chicote
Quando dança, perturba o ar e marca e demarca o corpo 
E dá-se a ver em grandes letreiros. 

Vem! No contrapé do vírus 
E vou te afagar os cabelos e lábios
Tanto zelo em átimos de vida 
Num beijo mais rápido que o contágio. 

Tão jovens e tão desafiados 
Eis um coração, eis uma razão 
Fique em casa com a minha vida.. A sua, sozinho, acabei de amar na esteira. 

Décio Plácido, 30.03.2020.

29 fevereiro 2020

Diz-me se você gostou tanto
Se nem sentiu a madrugada, e
Que foi o dia que se apressou
Em ofuscar os nossos olhos 
Se estava do teu gosto, pergunto-me...
A música, o jantar, os beijos, o atalé
O movimento das mãos, inclinação do olhar 
Não se apresse na resposta, nem precisa falar 
Diz-me se você gostou dos termos
E se naquela rua, no final de tudo
Já se descortinava a pedra, o esteio
De uma nova estrada tempo a fora
Se você ouviu a mesma música 
Que eu dançava sem demonstrar 
Se você já sentia o cheiro 
Das flores que já guardei pra te dar 
Diz-me que a noite surpreendeu 
Não tanto pelo tempo das horas -
Que se multiplicavam enquanto se extinguiam -
Mas pelo tempo que levou pra começar 
Décio Plácido, 27.01.2020
O que você fazia
Enquanto fazia falta?
Que flores colhia?
Que gostos sentia?
Enquanto os perfumes dos lençóis
Se perdiam na lavanderia...
Que nomes dizia?
Quantos foram os sonhos...
Sabe qual a cor
Dos dias que vivi?
O que você fazia
Enquanto fazia falta?
Só sei de ausências
De paginas em branco
Nuvens intransponíveis e
Pessoas de uniforme.
Nem em sonho me vinha...
Nem no trago te sentia.
Todo vazio
Transborda qualquer contido.
O que você fazia
Enquanto fazia falta?
Ao menos se divertia ou
Algum alívio desfrutava?
Não era mais falta
Mas uma presença mal acabada. 
Décio Plácido, 29.01.2020
O que mais você ama? 
O que você pensa da beleza?
Quero saber cada detalhe
Do que lhe interessa (lhe apetece)
O que lhe rouba o sono? 
Por que sustenta o olhar? 
Entender as minúcias do seu desejo
O que lhe move e enlouquece.
Se você prefere a vida inteira 
Ou somente até morrer 
Se o amor é um sonho eterno
Ou um destino desde o nascer... Para que você se arruma?
De onde brota o sorriso, o choro, o gargalhar?
Quero estar por dentro 
Das coisas dentro de você... O que dirige seus pensamentos? 
Que estética você prefere? 
O que só confessa ao espelho
O que você canta no chuveiro... O que te faz renovar?
Se você ainda pensa em casamento...
Vou tateando neste acerta e ganha 
Até à sua essência poder falar.
Décio Plácido, 03.02.2020
A noite encobre nossos desejos 
Seu corpo leve 
Distorce meus anseios 
Num cultivo de afetos
Atrevidos e sem manejo! 
As palavras contorcionadas
Meu corpo entregue
Numa névoa sem trégua 
De suor e calor 
Desleitura somática encarnada!
A manhã traz o cansaço 
Nossos corpos marcados 
Bocas, dentes e garras 
Ainda ardiam os arranhados
Ideias indomáveis ganham espaço!
A noite reconhece os corpos
Os dias traduzem desejos!
Décio Plácido, 15.02.2020
Quanto de delírio há no amor?
Quanto de cansaço e
Quantas são as letras tortas 
Apregoadas sobre suspiros? 
Quanta cafeína é necessária
Para um sono injusto?
Quanto excitação para servir
Palavras sem cor e sabor? 
Quantas folhas pautadas 
Para narrar minha loucura 
Faz-se preciso e capital 
Neste idioma alucinado? 
Quanto de delírio há no amor ?
O que não pode ser atrofiado
Para se erigir acima da fadiga
E revelar qualquer sentido ignorado? 
Quanta psicologia é necessária
Para uma vida incerta? 
Quanto de fala e reencantamento
Servem a um novo existir? 
Quantos diários incompletos 
Foram amontoados no meu inferno
Para que não se saboreasse 
A implosão caótica do devir?
Quanto de delírio há no amor? 
Quantas questões o amor cala?
Décio Plácido, 17.02.2020.

Mais do Mesmo Alívio!!!