29 novembro 2024

Passarinho

Queria escrever um passarinho.

Não o descrever,

Nem enumerar suas cores.

Nem o pintar em versos.

Mas dizer como me chega e

Que arrepio na espinha me traz. 


Queria escrever um passarinho. 

Palavras que voassem… 

Os versos bicando as flores,

Rimas fazendo o ninho,

Aconchegando os verbos como ovinhos,

Guardando o calor que me traz. 


Sentir a inexatidão do grassar por aí. 

Mesmo sem poder grava-lo,

Sem entender com os olhos 

E a alma se alegra não sei o porquê.

Dos rasantes, da elegância, da elevação. 

Do abstrato que toca meu coração. 


Escreveria feliz a ausência de matéria, 

Só um carimbo de impressão talvez.  

No traçado incerto dos voos

Amar como a destreza dos pousos. 

Queria escrever um passarinho 

E a liberdade de só existir de forma selvagem. 


18 novembro 2024

Eu rasguei a face do chão 

Com a palavra mais pesada 

Que saiu da minha alma. 

Aliviando a tensão indesejada 

De querer ser mais e mais. 


Os meus pés seguraram bem 

Os textos que tentavam me definir.

As frases mais ordinárias.

Não sei de reação mais solitária 

Que se contentar com o que se é. 


Meu peito finalmente se abriu 

Quando medi o tamanho de minha sombra

E belisquei carinhosamente o espelho. 

Enquanto as vozes que antes me esculpiam

Se desfaziam, me esqueciam… jaziam. 


Achei ter entendido o bardo inglês:

É necessário ser depois de um ter sido.  

Não ser essencialmente o que se falou.

Rever na carne o que já se esqueceu. 

Reler nos ditos: a potência se anunciou!

10 novembro 2024

O amor definiu meus passos. 

Verificou minha respiração.

Ele me fez falar em vão…

O amor destruiu meu cansaço!


O amor preencheu meus buracos,

Como asfalto quente no chão batido.

Ele disse que tudo mais era falido.

O amor limpou todos os cacos!


O amor rolou e me desdobrou.

Fez de mim um homem nobre,

Que a todo tempo te descobre…

O amor – bandido! – se insinuou! 


O Amor agitou minhas mãos no ar.

Fez de tudo para que me notasse…

Ordenou que o Tempo parasse.

O Amor queria me ouvir declamar.


O amor é uma idiossincrasia. 

Um instante secular num segundo.

Apaixona o são e o moribundo… 

O amor – graças! – é sem anestesia. 

Décio Plácido, 10/11/24

Mais do Mesmo Alívio!!!